quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

MARIANO PUGA-POR ELE MESMO



MARIANO PUGA, POR ELE MESMO
JUBILEU DE DIAMANTE DO SAUDOSO PE MARIANO PUGA


(Veja as fotos do jubileu no final da página)

JUBILEU DE DIAMANTE DO MARIANO-por Fraternidad Iesus Caritas Nosso irmão Mariano celebrou seu Jubileu de diamante (60 anos ) de ministério sacerdotal em Villa Francia, Santiago do Chile. No dia 25 de maio várias comunidades cristãs, agentes sociais e o povo de Deus se uniram para celebrar a alegria e o dom de Deus na vida do Mariano. Parabéns e felicitações de todas as fraternidades! VEJA O VÍDEO DO MARIANO CANTANDO E PREGANDO CLICANDO AQUI: 



ALGO DE MARIANO PUGA POR ELE MESMO


No retiro de Coronel Fabriciano, de 04 a 11 de janeiro de 2002, pregado pelo Pe. Mariano.

Éramos sete irmãos de família burguesa do Chile, criados num ambiente conservador, tradicional. Estudamos num colégio anglicano. Tinha o rigor característico do império britânico dos anos 40. Depois fui matriculado para fazer o ensino secundário numa escola militar de Santiago. De lá, saí para fazer arquitetura na Universidade Católica.

Vinha de família sacramental, de piedade tradicional. Na Universidade encontrei um monge que me questionou: “E tu o que esperas para te converter? Retruquei: “  sou católico, converter mais o quê? Não sou evangélico para pensar em conversão" .

Naquele tempo, ter bíblia era coisa de padres ou de anglicano, mas não de leigo católico. Perguntei-lhe: “O que devo fazer?”  Ele me respondeu: “Começa a ler o Evangelho”. Ele me indicou o capítulo 25 de Mateus. Quando o li, senti uma espécie de vazio. Percebi que era um católico praticante, de missa dominical, mas um ignorante de Cristo.


O reitor da Universidade Católica era um sacerdote. Nas férias, ele promoveu uma atividade para alguns alunos. Lembro-me que chovia bastante. Fomos visitar pessoas que viviam às margens do rio. Das minhas visitas, lembro-me de uma senhora eu vivia com seus três filhos, dois cachorros. Quando cheguei, ela estava fervendo o leite. O pão era sobra que tirava do lixo e servia às crianças com um arame. Não sabia na época o que era tuberculose. Essa foi a minha primeira experiência com os pobres.

Depois veio a experiência do Lixão São Manoel. Era tempo de abertura da Universidade aos pobres nos anos de 50 a 53. Começava todo um questionamento de fé, de vivência do cristianismo, de compromisso. Dos que nos sentimos tocados, uns 11 entramos no seminário. Era tempo do Papa Pio XII. Ele acabava de proibir a experiência dos sacerdotes operários. E todos nós queríamos ser padres operários.

Quando entrei no seminário, deixei nova, arquitetura, experiência com os pobres, com o lixão... Cheguei à conclusão: vale a pena deixar tudo e partir para o seminário! No seminário, havia mais de 14 nacionalidades, vindos da América Latina e da Europa. Era um seminário de ponta da América Latina. Tempo marcado pelo Evangelho, pela Doutrina Social da Igreja, pelo Irmão Carlos, pelo Pe. Voillaume.

As coisas não eram tão tranquilas. Tivemos até visitador de Roma. Mas, confesso-lhes, foi uma época riquíssima.

Depois da ordenação fui a Paria, estudar liturgia. Até hoje não sei por que fui fazer liturgia. Nossos professores eram monges, não tinham nenhuma pastoral. E nós queríamos uma pastoral renovada. Os monges diziam que não estávamos lá para isso. Era para fazer liturgia séria. Tínhamos uma forte carga de história da liturgia. Aí aprendi que se gasta meia hora de preparação das oferendas no rito copta. Porém, também descobri um sentido da liturgia e não das rubricas. Eu me debrucei sobre a fonte da liturgia...

Acabei ficando doente e tive de voltar ao Chile. O cardeal Silva Henriquez me convidou para viver com ele, para que pudesse cuidar de mim. Por uns seis meses eu morei no centro de Santiago. Depois o cardeal me propôs que eu fosse procurar uma casa para sair do palácio episcopal. Encontrei uma num bairro de classe média. Acabei indo morar com alguns seminaristas e fazer experiência de pequenas comunidades no meio dos pobres. Era a perspectiva do ano de Medellin, 1968, criar pequenos grupos de seminaristas vivendo no meio dos pobres, na periferia. Foi muito rico viver aí por uns cinco anos. Tempo de socialismo, cristãos para o socialismo...

Todos nós que fizemos essa opção fomos mandados embora. Roma queria recuperar o grande seminário. Falei ao cardeal que estava partindo para o norte do Chile para fazer uma experiência como sacerdote operário, com um padre meio louco, mas quem se adaptava à loucura dele podia aprender muito.

Era uma experiência que reunia gente de todo o lado e tele-revisada por Karl Rahner. Era uma experiência pastoral da Igreja, sem contato com o bispo (transferido daí por nossa culpa). Consistia praticamente em viver no meio do povo e como o povo; frequentando os sindicatos, os partidos, os movimentos populares. Depois de ter sido padre espiritual do seminário e professor de liturgia, depois da descoberta dos pobres e dessa experiência no norte do Chile, aconteceu o golpe de Pinochet. Todos os estrangeiros foram mandados embora e eu fiquei por ser chileno.

O golpe para nós era impensável. Vivíamos numa prepotência muito grande. O golpe era praticamente impensável por nós, que nos julgávamos como a única democracia estável na América Latina. O golpe destruiu nossas entranhas. Penso que o golpe chileno foi muito mais duro que em outros países. Algo inesperado! A crueldade do golpe quebrou todas as estruturas populares do Cjhile (sindicatos, partidos, associações...). Arrasaram tudo!

Alguns bispos, com um grupo de padres e religiosas começaram a dar asilo a estrangeiros e a chilenos perseguidos. Chegamos mais ou menos a umas 680 pessoas. Foi uma experiência impressionante com marxistas. Eles nos diziam: “Como vocês nos recebem assim, mesmo sabendo que somos inimigos e os acusamos de fomentar a religião, a que chamamos ópio do povo? Mesmo assim, vocês correm o risco por nossa causa!” Foi um ótimo tempo de solidariedade acima de todas as fronteiras.

Começamos também a ser perseguidos e detidos. Até hoje há gente do nosso grupo que foi detida e está desaparecida!

Quando fui detido, a comunidade colocou-se frente à seguinte questão: “Nós, como cristãos, vamos baixar a guarda, ou tomar uma decisão”? Decidiram manter-se fiéis. Depois de alguns dias, um que tinha se destacado nesta decisão foi detido e nunca mais foi encontrado.

Bem, essa experiência vocês viveram aqui também no Brasil. A Igreja na América Latina era uma força para nós. O Continente tornou-se um altar de mártires.

Numa dessas perseguições, fui chamado por Pinochet, junto com outros, por termos sido alunos dos militares. Preparamos o que falar. Quando chegamos, o general disse, olhando para mim: “Você que foi tão bom aluno, como caiu nas mãos dos marxistas?” Respondi: “General, tenho um grande agradecimento a vocês, pois no colégio militar vocês me ensinaram a disciplina, me ensinaram que ordens dos superiores não se discutem. Sendo assim, não discuto ordens do meu general que se chama Jesus Cristo. Ele me ensinou a amar os pobres. A disciplina que aprendi  no colégio militar eu a direciono ao meu general Jesus Cristo e ao Evangelho”.

Pinochet disse: “Não sou como Franco e Fidel Castro e vocês católicos estão contra mim! Os evangélicos me apoiam. Se vocês continuarem assim, não há como continuar conversando com vocês!” Olhando para mim, disse: “Você precisa de um tempo de retiro!”

Assim, fui viver dois meses de exílio em Lima, com os Irmãozinhos de Jesus. Tinha o hábito de, a cada cinco anos, fazer um mês de Nazaré. Desta vez, fiz dois. Depois, voltei ao Chile e ao grupo de trabalho. O bispo me transferiu com outros dois padres. Fizemos uma experiência de comunidade. Todos trabalhávamos e ganhávamos cinco mil pesos (15 dólares) cada um.

Foi um tempo rico de partilha com o povo. Experiência única de solidariedade com o povo. Começava, nessa época, o movimento de protestos. As favelas se manifestavam de forma pacífica; havia denúncias de torturas. Estava forte o movimento da não violência ativa, que tinha Gandhi como grande inspirador.

Tenho muito a agradecer a Deus pelas diversas oportunidades que tive na vida. Em 1986, passei um paraíso de três meses com D. Pedro Casaldáliga, em São Félix do Araguaia. Em 1990, mais três meses com Leonardo Boff. Em 1992, com 60 anos, assumi como pároco de São Caetano, distrito violento de Santiago. É um bairro quente, violento. Se você tomar um taxi em Santiago e disser que quer ir para lá, o taxista não o leva. Entretanto, se você disser que vai para a casa do Pe. Mariano, ele aceita.

Amanhã, dia 11 de janeiro (de 2002) começaremos na paróquia uma avaliação da caminhada para passar a paróquia ao novo pároco, um bom sacerdote do Prado. Vou para a diocese de Chiloé, no sul do Chile, com um bispo com o qual fiz aquela experiência no norte do país. Bom, sou um missionário itinerante!

Um último recado (esta era a última pregação do retiro que ele pregava em Cel. Fabriciano). Não é justo que a Igreja do Brasil fique fechada dentro deste país. Mesmo hoje, quando muitos de vocês dizem que as tendências são outras e há retrocessos nesta Igreja. Vocês têm uma caminhada história de renovação eclesial e compromissos sociais com os pobres que têm muito a transmitir à América Latina.

O mundo é maior que o Brasil e vocês têm responsabilidade com as Igrejas do Continente. As fraternidades do Brasil têm responsabilidade na América Latina e na África. Não é justo esse fechamento de vocês. Faço-lhes este pedido em nome do povo da América Latina, que precisa conhecer e aprender com a renovação pastoral e teológica que vocês realizam na Igreja do Brasil.

Fechar-se aqui na Igreja do Brasil é pecado contra Cristo e contra os pobres!

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Jubileu de diamante sacerdotal em 25/05/2019