MARIANO PUGA, POR ELE MESMO JUBILEU DE DIAMANTE DO SAUDOSO PE MARIANO PUGA (Veja as fotos do jubileu no final da página)
JUBILEU DE DIAMANTE DO MARIANO-por Fraternidad Iesus Caritas Nosso irmão Mariano celebrou seu Jubileu de diamante (60 anos ) de ministério sacerdotal em Villa Francia, Santiago do Chile. No dia 25 de maio várias comunidades cristãs, agentes sociais e o povo de Deus se uniram para celebrar a alegria e o dom de Deus na vida do Mariano. Parabéns e felicitações de todas as fraternidades! VEJA O VÍDEO DO MARIANO CANTANDO E PREGANDO CLICANDO AQUI:
|
No retiro de Coronel Fabriciano, de 04 a 11 de janeiro de 2002, pregado pelo Pe. Mariano.
Éramos sete irmãos de família burguesa do Chile, criados num ambiente conservador, tradicional. Estudamos num colégio anglicano. Tinha o rigor característico do império britânico dos anos 40. Depois fui matriculado para fazer o ensino secundário numa escola militar de Santiago. De lá, saí para fazer arquitetura na Universidade Católica.
Vinha de família
sacramental, de piedade tradicional. Na Universidade encontrei um monge que me
questionou: “E tu o que esperas para te converter? Retruquei: “ sou católico, converter mais o quê? Não sou
evangélico para pensar em conversão" .
Naquele tempo, ter bíblia
era coisa de padres ou de anglicano, mas não de leigo católico. Perguntei-lhe: “O
que devo fazer?” Ele me
respondeu: “Começa a ler o Evangelho”. Ele me indicou o capítulo 25 de
Mateus. Quando o li, senti uma espécie de vazio. Percebi que era um católico
praticante, de missa dominical, mas um ignorante de Cristo.
O reitor da Universidade
Católica era um sacerdote. Nas férias, ele promoveu uma atividade para alguns
alunos. Lembro-me que chovia bastante. Fomos visitar pessoas que viviam às
margens do rio. Das minhas visitas, lembro-me de uma senhora eu vivia com seus
três filhos, dois cachorros. Quando cheguei, ela estava fervendo o leite. O pão
era sobra que tirava do lixo e servia às crianças com um arame. Não sabia na
época o que era tuberculose. Essa foi a minha primeira experiência com os pobres.
Depois veio a experiência
do Lixão São Manoel. Era tempo de abertura da Universidade aos pobres nos anos
de 50 a 53. Começava todo um questionamento de fé, de vivência do cristianismo,
de compromisso. Dos que nos sentimos tocados, uns 11 entramos no seminário. Era
tempo do Papa Pio XII. Ele acabava de proibir a experiência dos sacerdotes
operários. E todos nós queríamos ser padres operários.
Quando entrei no
seminário, deixei nova, arquitetura, experiência com os pobres, com o lixão...
Cheguei à conclusão: vale a pena deixar tudo e partir para o seminário! No
seminário, havia mais de 14 nacionalidades, vindos da América Latina e da
Europa. Era um seminário de ponta da América Latina. Tempo marcado pelo
Evangelho, pela Doutrina Social da Igreja, pelo Irmão Carlos, pelo Pe.
Voillaume.
As coisas não eram tão tranquilas. Tivemos até visitador de Roma. Mas, confesso-lhes, foi uma época riquíssima.
As coisas não eram tão tranquilas. Tivemos até visitador de Roma. Mas, confesso-lhes, foi uma época riquíssima.
Depois da ordenação fui a
Paria, estudar liturgia. Até hoje não sei por que fui fazer liturgia. Nossos
professores eram monges, não tinham nenhuma pastoral. E nós queríamos uma
pastoral renovada. Os monges diziam que não estávamos lá para isso. Era para fazer
liturgia séria. Tínhamos uma forte carga de história da liturgia. Aí aprendi
que se gasta meia hora de preparação das oferendas no rito copta. Porém, também
descobri um sentido da liturgia e não das rubricas. Eu me debrucei sobre a
fonte da liturgia...
Acabei ficando doente e
tive de voltar ao Chile. O cardeal Silva Henriquez me convidou para viver com
ele, para que pudesse cuidar de mim. Por uns seis meses eu morei no centro de
Santiago. Depois o cardeal me propôs que eu fosse procurar uma casa para sair
do palácio episcopal. Encontrei uma num bairro de classe média. Acabei indo
morar com alguns seminaristas e fazer experiência de pequenas comunidades no
meio dos pobres. Era a perspectiva do ano de Medellin, 1968, criar pequenos
grupos de seminaristas vivendo no meio dos pobres, na periferia. Foi muito rico
viver aí por uns cinco anos. Tempo de socialismo, cristãos para o socialismo...
Todos nós que fizemos essa
opção fomos mandados embora. Roma queria recuperar o grande seminário. Falei ao
cardeal que estava partindo para o norte do Chile para fazer uma experiência
como sacerdote operário, com um padre meio louco, mas quem se adaptava à
loucura dele podia aprender muito.
Era uma experiência que
reunia gente de todo o lado e tele-revisada por Karl Rahner. Era uma
experiência pastoral da Igreja, sem contato com o bispo (transferido daí por
nossa culpa). Consistia praticamente em viver no meio do povo e como o povo;
frequentando os sindicatos, os partidos, os movimentos populares. Depois de ter
sido padre espiritual do seminário e professor de liturgia, depois da
descoberta dos pobres e dessa experiência no norte do Chile, aconteceu o golpe
de Pinochet. Todos os estrangeiros foram mandados embora e eu fiquei por ser
chileno.
O golpe para nós era
impensável. Vivíamos numa prepotência muito grande. O golpe era praticamente
impensável por nós, que nos julgávamos como a única democracia estável na
América Latina. O golpe destruiu nossas entranhas. Penso que o golpe chileno
foi muito mais duro que em outros países. Algo inesperado! A crueldade do golpe
quebrou todas as estruturas populares do Cjhile (sindicatos, partidos,
associações...). Arrasaram tudo!
Alguns bispos, com um
grupo de padres e religiosas começaram a dar asilo a estrangeiros e a chilenos
perseguidos. Chegamos mais ou menos a umas 680 pessoas. Foi uma experiência
impressionante com marxistas. Eles nos diziam: “Como vocês nos recebem assim,
mesmo sabendo que somos inimigos e os acusamos de fomentar a religião, a que
chamamos ópio do povo? Mesmo assim, vocês correm o risco por nossa causa!” Foi
um ótimo tempo de solidariedade acima de todas as fronteiras.
Começamos também a ser
perseguidos e detidos. Até hoje há gente do nosso grupo que foi detida e está
desaparecida!
Quando fui detido, a comunidade
colocou-se frente à seguinte questão: “Nós, como cristãos, vamos baixar a guarda,
ou tomar uma decisão”? Decidiram manter-se fiéis. Depois de alguns
dias, um que tinha se destacado nesta decisão foi detido e nunca mais foi
encontrado.
Bem, essa experiência
vocês viveram aqui também no Brasil. A Igreja na América Latina era uma força
para nós. O Continente tornou-se um altar de mártires.
Numa dessas perseguições,
fui chamado por Pinochet, junto com outros, por termos sido alunos dos
militares. Preparamos o que falar. Quando chegamos, o general disse, olhando
para mim: “Você que foi tão bom aluno, como caiu nas mãos dos marxistas?” Respondi:
“General,
tenho um grande agradecimento a vocês, pois no colégio militar vocês me
ensinaram a disciplina, me ensinaram que ordens dos superiores não se discutem.
Sendo assim, não discuto ordens do meu general que se chama Jesus Cristo. Ele
me ensinou a amar os pobres. A disciplina que aprendi no colégio militar eu a direciono ao meu
general Jesus Cristo e ao Evangelho”.
Pinochet disse: “Não
sou como Franco e Fidel Castro e vocês católicos estão contra mim! Os
evangélicos me apoiam. Se vocês continuarem assim, não há como continuar
conversando com vocês!” Olhando para mim, disse: “Você precisa de um tempo de
retiro!”
Assim, fui viver dois
meses de exílio em Lima, com os Irmãozinhos de Jesus. Tinha o hábito de, a cada
cinco anos, fazer um mês de Nazaré. Desta vez, fiz dois. Depois, voltei ao
Chile e ao grupo de trabalho. O bispo me transferiu com outros dois padres.
Fizemos uma experiência de comunidade. Todos trabalhávamos e ganhávamos cinco
mil pesos (15 dólares) cada um.
Foi um tempo rico de
partilha com o povo. Experiência única de solidariedade com o povo. Começava,
nessa época, o movimento de protestos. As favelas se manifestavam de forma pacífica;
havia denúncias de torturas. Estava forte o movimento da não violência ativa,
que tinha Gandhi como grande inspirador.
Tenho muito a agradecer a
Deus pelas diversas oportunidades que tive na vida. Em 1986, passei um paraíso
de três meses com D. Pedro Casaldáliga, em São Félix do Araguaia. Em 1990, mais
três meses com Leonardo Boff. Em 1992, com 60 anos, assumi como pároco de São
Caetano, distrito violento de Santiago. É um bairro quente, violento. Se você
tomar um taxi em Santiago e disser que quer ir para lá, o taxista não o leva.
Entretanto, se você disser que vai para a casa do Pe. Mariano, ele aceita.
Amanhã, dia 11 de janeiro
(de 2002) começaremos na paróquia uma avaliação da caminhada para passar a
paróquia ao novo pároco, um bom sacerdote do Prado. Vou para a diocese de
Chiloé, no sul do Chile, com um bispo com o qual fiz aquela experiência no
norte do país. Bom, sou um missionário itinerante!
Um último recado (esta era
a última pregação do retiro que ele pregava em Cel. Fabriciano). Não é justo
que a Igreja do Brasil fique fechada dentro deste país. Mesmo hoje, quando
muitos de vocês dizem que as tendências são outras e há retrocessos nesta
Igreja. Vocês têm uma caminhada história de renovação eclesial e compromissos
sociais com os pobres que têm muito a transmitir à América Latina.
O mundo é maior que o
Brasil e vocês têm responsabilidade com as Igrejas do Continente. As
fraternidades do Brasil têm responsabilidade na América Latina e na África. Não
é justo esse fechamento de vocês. Faço-lhes este pedido em nome do povo da
América Latina, que precisa conhecer e aprender com a renovação pastoral e
teológica que vocês realizam na Igreja do Brasil.
Fechar-se aqui na Igreja
do Brasil é pecado contra Cristo e contra os pobres!