quinta-feira, 8 de junho de 2017

DO PRIOR DE TAIZÉ- O ESPÍRITO SANTO.



(Lembro que o autor escreveu isso no hemisfério norte, cujas estações do ano são contrárias às do hemisfério sul)


Irmão Alois, prior de Taizé

"Em muitas regiões do mundo, quando a festa de Pentecostes chega, a natureza torna-se bonita. Rompe a primavera, o verão já se anuncia, o trigo cresce e o vento se diverte jogando com as espigas como se fosse ele quem as faz crescer. 

Para o povo judeu, a festa de Pentecostes, Shavuot, era uma ação de graças pelo trigo maduro. Em muitas de suas parábolas, Jesus falou do Reino de Deus que vem através de amadurecimento. Pentecostes anuncia o tempo da colheita. 

Entretanto, Pentecostes é também o surgimento da novidade, do inesperado. O que aconteceu no Sinai era como um prenúncio que, segundo a fé cristã, agora encontra o seu cumprimento. Deus faz a sua vontade conhecida, de modo que a lei não mais será escrita em tábuas de pedra, mas no coração. Não é apenas Moisés que está diante de Deus: o fogo do Espírito desce sobre cada um. Pelo Espírito Santo, Deus vem habitar em nós. Ele está aqui, sem intermediários. É para fazer-nos entrar num relacionamento pessoal com Deus que o Espírito Santo é dado para nós. 

Se o Espírito Santo permanece muitas vezes discreto, sem tentar intervir, é porque não quer tomar nosso lugar, mas fortalecer nossa pessoa. Nas profundezas do nosso ser, ele diz incansavelmente o sim de Deus à nossa existência. Então, essa é uma oração acessível a todos: "Que o teu sopro de bondade me guie!" (Salmo 143,10). Impulsionados por esse alento podemos avançar. 

No final de sua vida, o irmão Roger dirigia as suas orações com muita frequência ao Espírito Santo. Ele queria incutir-nos a confiança em sua presença invisível. Ele sabia que a luta interior para abandonar -se ao sopro do Espírito e crer no amor de Deus é decisivo na vida humana. 

Durante a minha estadia com meus irmãos, que vivem na Coréia, nós fomos para um mosteiro budista. Recebemos ali uma recepção muito fraterna. Eu senti uma grande admiração por aqueles monges budistas que corajosamente procuram ser consequentes com suas crenças. Eles fazem um enorme esforço para sair de si mesmos e se abrir para uma realidade maior do que eles, o absoluto. Eles desenvolveram profunda sabedoria, uma busca pela misericórdia que nós compartilhamos com eles. 


Mas como eles podem fazê-lo, eu me perguntava, sem acreditar em um Deus que os ama pessoalmente? Seu compromisso envolve uma solidão extrema. Nós, como cristãos, acreditamos que o Espírito Santo habita em nós, Cristo ensinou-nos a dirigir a Deus dizendo: "Você (tu)". É um passo enorme, impensável para uma grande parte da humanidade. 


Voltei de lá assombrado com a revelação trazida por Cristo e disse a mim mesmo: "não é urgente, para nós cristãos, termos mais confiança na presença do Espírito Santo e para mostrar com a nossa vida que Ele está atuando no mundo? 


Comecemos pelo aprofundamento do mistério de comunhão que nos une. Quando juntos nos voltamos para Cristo, numa oração em comum, o Espírito Santo nos une nesta única comunhão, que é a Igreja, e nos concede nascermos para uma nova vida. 

O dom do Espírito Santo está ligado ao perdão. Cristo ressuscitado diz aos seus seguidores: "Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados, serão perdoados." (João 20,22-23). A Igreja é antes de tudo uma comunhão de perdão. Quando entendemos que Deus nos dá seu perdão, nos tornamos capazes de dá-lo também aos demais. É sabido, porém, que nossas comunidades, nossas paróquias, estão sempre desprovidas e longe de serem o que sonhamos delas. Mas o Espírito Santo está continuamente presente na Igreja e nos faz avançar no caminho do perdão. 


Se Cristo nos envia a anunciar a Boa Nova ao mundo inteiro, ele também nos pede para discernirmos os sinais da sua presença ali onde ele nos precede. Os primeiros cristãos ficaram surpresos ao descobrirem a presença do Espírito ali onde eles não esperavam (veja Atos 10). O próprio Jesus comoveu-se pela confiança tenaz de uma mãe grega (Marcos 7,24-30) e pela fé de um soldado romano (Lucas 7,1-10). Somos nós capazes de surpreender-nos reconhecendo as expectativas espirituais de nossos contemporâneos? 

Quando um dia fui visitar meus irmãos que vivem em Dakar, Senegal, fiquei impressionado de ver a amizade que foi criado no bairro entre eles e alguns muçulmanos. Quando eu estava prestes para ir, chegou um homem mais velho, muçulmano, muito bem vestido. No começo eu o confundi com um dignitário, mas era o avô de uma família vizinha que queria me dizer o quão felizes que os fazia o fato de os os irmãos estarem lá. Eu lhe respondi: "A alegria dos irmãos é ainda maior que a de vocês". Ele me respondeu com firmeza: "Não, é a nossa alegria que é maior." 


Deixemos crescer em nossas vidas os frutos do Espírito: "Amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, confiança nos outros, mansidão, domínio si mesmo" (Gálatas 5,22-23). O Espírito nos leva para com os outros e, sobretudo, aos mais abandonados. Numa solidariedade concreta com os mais desfavorecidos, a luz do Espírito Santo pode inundar nossas vidas.


Sim, o Espírito Santo está atuando hoje. Ele renova sem cessar o amor de Deus em nosso coração. Feliz quem não se abandona ao medo, mas à inspiração do Espírito Santo. Ele é também a água viva, o Espírito de paz que pode vivificar o nosso coração e comunicar-se, através de nós, ao mundo inteiro".

(Atrever-se a acreditar, Editorial Perpetuo Socorro, págs.79-83)