É
preciso passar pelo deserto e aí permanecer para receber a graça de Deus; é lá
que nos esvaziamos, que extraímos de nós tudo o que não é de Deus e que
esvaziamos completamente esta pequena casa da nossa alma para deixar todo o
espaço apenas para Deus.
Os judeus passaram pelo deserto, Moisés viveu lá antes de receber a sua missão, São Paulo e São João Crisóstomo prepararam-se no deserto [...].
Os judeus passaram pelo deserto, Moisés viveu lá antes de receber a sua missão, São Paulo e São João Crisóstomo prepararam-se no deserto [...].
É um tempo de graça, é um período pelo qual toda a alma que quer produzir frutos tem necessariamente de passar. Ela precisa deste silêncio, deste recolhimento, deste esquecimento de todo o criado, no meio dos quais Deus estabelece o Seu reino e forma nela o espírito interior: a vida íntima com Deus, a conversa da alma com Deus na fé, na esperança e na caridade. Mais tarde, a alma produzirá frutos exatamente na medida em que o homem interior se tiver formado nela (Ef 3, 16) [...].
Não se dá o que se não tem e é na solidão, nesta vida apenas e só com Deus, neste recolhimento profundo da alma que esquece tudo para viver exclusivamente em união com Deus, que Deus Se dá inteiramente àquele que se dá assim a Ele. Dai-vos inteiramente somente a Ele [...] e Ele Se dará inteiramente a vós. [...]. Vede São Paulo, São Bento, São Patrício, São Gregório Magno e tantos outros, quão longos tempos de recolhimento e de silêncio! Subi mais acima: olhai para São João Baptista, olhai para Nosso Senhor. Nosso Senhor não tinha necessidade disso, mas quis dar-nos o exemplo. (Charles de Foucauld, carta ao Padre Jerónimo, 19 de Maio de 1898).
Charles de Foucauld relata sua meditação: "Quero passar sobre a terra de maneira obscura como um viajante à noite. Viver na pobreza, na abjeção, no sofrimento, na solidão, no abandono para estar na vida com o meu Mestre, o meu Irmão, o meu Esposo, o meu Deus, que viveu assim toda a sua vida e me dá esse exemplo desde o nascimento". (Meditações sobre o Evangelho).
Na era em que estamos vivendo,
onde se busca loucamente o poder, a glória terrena, a fama, ele vem como sinal
de contradição a nos dizer que ainda é possível vivermos essa experiência
fantástica do deserto interior, do viver
no mundo, mas não para o mundo e sim para o bom Deus. Através da escuta da
Palavra de Deus, da Eucaristia e da renúncia dos barulhos exteriores e da zoada
dos demônios sonoros e visuais. Pela graça de Deus e pelo poder do Espírito
Santo podemos viver várias modalidades de deserto em prol da nossa maturidade
cristã. A passagem pelo deserto é uma atitude imensurável, é uma experiência
com Deus abissal que marca para sempre a nossa alma em comunhão profunda com
Ele.
Charles de Foucauld passa para
nós um autêntico testemunho de busca de Deus de forma radical, de fé, de pobreza, de humildade e de amor pela salvação
das almas. Ele é um mestre na espiritualidade cristã, a sua espiritualidade de
Nazaré é um clássico na História da Igreja e responde as demandas do vazio e da
ansiedade do ser humano da pós-modernidade. É impactante na busca radical do
Absoluto.
Inácio José do Vale