quarta-feira, 11 de março de 2020

7- ORAÇÃO DE COMPAIXÃO

SÉTIMA ETAPA: A ORAÇÃO DE COMPAIXÃO NAS PEGADAS DO SERVO SOFREDOR. 


A maioria das fraternidades está mergulhada em situações de violência e de opressão e muitas vezes nos confrontamos com o problema terrível do sofrimento e do mal, tendo a impressão, como no livro de Jó, que o mal sempre triunfa. 


A oração, nessa situação, não será simplesmente assumir o grito daqueles que sofrem, assumir a pergunta angustiada dos que são esmagados pelo mal e que não compreendem e se revoltam? 

Não há palavras diante do sofrimento. Talvez seja por isso, aliás, que Deus parece deixar sem resposta a queixa angustiada de Jó, sua sede de justiça. Com efeito, Deus se reserva uma resposta não por palavras, mas por Seu Filho, Aquele que realiza o destino do Servo Sofredor de Isaías. Não encontrei no Irmão Carlos nenhuma meditação propriamente dita sobre os cânticos do Servo, mas sente-se bem que cada vez que medita sobre a vida e a paixão de Jesus refere-se implicitamente a eles, porque a figura de Jesus de Nazaré é inseparável da do Servo Sofredor. Esse servo misterioso cujo rosto parece confundir-se com o do povo esmagado pelo sofrimento, no fundo do exílio. 

Vocês conhecem os Cânticos do Servo, no segundo livro de Isaías. O povo eleito perdera tudo: a terra, a acidade, o templo, morada de Deus. Foi deportado para viver na escravidão. E eis que, de repente, aparece um profeta, cujo nome nem mesmo se sabe. Ele pressente que esse sofrimento não é em vão e, pouco a pouco, no coração mesmo dessa situação desesperadora, ele revela a figura de um misterioso Servo: o Justo, o Inocente, que tomará sobre si o castigo e assumirá todo esse sofrimento até a morte. Ele oferecerá a vida em intercessão pelos pecadores. Deus, então, o exaltará, fazendo dele “a luz das nações” (Is 42,6). 

Jesus de Nazaré teve plena consciência de ter sido enviado ao mundo para realizar em sua vida o destino do Servo de Isaías? “ O Filho do Homem ão veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate pela multidão” (Mc 10,45). 

Hoje tantos países e tantos povos parecem misteriosamente associados, em sua carne e nesta Paixão do Servo, que permanece tragicamente atual e nós sentimos bem que a lógica de Nazaré nos arrasta a partilhar com Jesus a angústia e o desprezo que marcam a vida dos pobres nessas situações de violência e de opressão. 

Toda a vida do Irmão Carlos foi dominada pelo desejo apaixonado de imitar Jesus de Nazaré e de segui-lo em seu caminho de Servo, até o fim. 

“Pensa que deves morrer mártir, de uma morte violenta, dolorosa… e deseja que seja hoje”! 

Na cruz, a oração de Jesus é a vida oferecida em resgate pela multidão e em intercessão pelos pecadores. Estamos, então, no âmago da oração. Nessa hora, oração e oferecimento de toda a vida são uma só coisa. 

O Irmão Carlos nos legou uma oração que nada mais é que a expressão do seu desejo de unir toda a sua vida a este oferecimento de Jesus: a oração do abandono. 

Essa oração, realmente, é somente o eco da oração de Jesus: a oração do Filho aceitando do Pai, em suas mãos, seu destino de Servo. 

Ela evoca primeiramente o salmo 40, ao qual se refere a Epístola aos Hebreus: “Tu não quiseste sacrifícios nem oferendas, mas me fizeste um corpo. Não aceitaste os holocaustos nem as expiações pelos pecados. Então eu disse: Estou aqui, meu Deus, vim para fazer tua vontade, pois é de mim que as Escrituras falam” (Hb 10,5). 

Depois, a oração do Getsêmani, no meio da angústia: “Pai, que tua Vontade seja feita” (Mt 26,42). 

E, enfim, a última palavra de Jesus na cruz: “Pai, em tuas mãos entrego meu espírito” (Lc 23,46). 

Na Igreja do Oriente insiste-se muito sobre a “oração de Jesus”, a oração do coração. A repetição incansável do nome de Jesus, que se torna a expressão de um único desejo: “Senhor Jesus Cristo, tende piedade de mim, pecador”. 

A oração do abandono devia ser, para o Irmão Carlos, uma espécie de respiração… Se aos poucos, para nós também, ela se tornar como nossa respiração, talvez nossa vida se torne oração.