D.
Edson Tasquetto Damian (Bispo de S. Gabriel da Cachoeira, AM
1. PERFIL EMERGENTE DO
PRESBÍTERO DO NOVO MILÊNIO
Abertura do Dia de
Espiritualidade
Com o tema “Novo
Milênio: Novo Presbítero?!” e o sugestivo lema “Eis
que faço novas todas as coisas” (Ap 21,5), realizou-se de 02
a 06 de fevereiro de 2000, o 8° ENP. Acabamos de olhar o vídeo
deste evento e certamente cada um está se perguntando: Afinal
qual será o perfil do presbítero do novo milênio?
A “Pastores dabo
Vobis” já nos alertava para este tema: “Há uma
fisionomia essencial do presbítero que não muda: o
padre de amanhã, não menos que o de hoje, deverá
assemelhar-se a Cristo, que ofereceu em si mesmo o rosto definitivo
do presbítero, realizando um sacerdócio ministerial do
qual os apóstolos foram os primeiros a ser investidos; aquele
é destinado a perdurar, a reproduzir-se incessantemente em
todos os períodos
da história. O
presbítero do terceiro milênio será, neste
sentido, o continuador dos irmãos que, nos precedentes
milênios, animaram a vida da Igreja (...), mas, é
igualmente certo que a vida e o ministério do presbítero
se deve adaptar a cada época e a cada ambiente de vida” (PDV
5).
Com muita sabedoria,
Dom Helder nos diz: “Feliz de quem entende que é preciso
mudar muito para permanecer sempre o mesmo”.
O Pe Edênio
Valle, lúcido articulador dos últimos ENPs, tentou
esboçar o perfil emergente do novo presbítero numa
reflexão publicada na Vida Pastoral: “embora bem consciente
de que a figura do padre continuará sendo plural, resumirei
nos seguintes pontos o novo modo-de-ser que está emergindo (ao
menos idealmente), mas que precisa ser ainda cultivado”.
Num encontro de
presbíteros do Norte 1 aprofundamos e completamos o perfil que
partilho agora. Sonhamos alto com a consciência de que, como o
Profeta Elias, “temos longo caminho a percorrer” (1 Rs 19,7).
· O presbítero
do século XXI será alguém que (re)descobre e
sente o apelo do Deus vivo. Somente sobre a base de uma experiência
pessoal de seguimento de Jesus e de comunhão com Ele, com o
Pai e o Espírito,
o padre será alguém capaz de entusiasmar homens e
mulheres na mesma mística do seguimento e de ajudar o povo de
Deus a viver a testemunhar a fé na plenitude de sua vocação.
“O presbítero é um homem de Deus. Todavia, só
lhe é dado ser profeta na medida em que tenha feito a
experiência do Deus vivo. Só esta experiência o
fará portador duma Palavra poderosa para transformar a vida
pessoal e social das pessoas, de conformidade com o desígnio
do Pai” (Puebla, 693).
· A caridade
pastoral, vivida em sua dupla vertente: amor ao Bom Pastor e amor às
pessoas que ele confia ao nosso ministério, será a
marca da espiritualidade do presbítero e o eixo integrador
entre vida interior e ação evangelizadora.
· Em meio a
tantas solicitações e urgências, o presbítero
precisa liberar-se para, nos termos de hoje, dedicar-se mais à
oração e à pregação da Palavra
(cf. At 6,4) como sendo as dimensões fundamentais de seu
ministério. Ele precisa voltar a ser um mistagogo e um
discípulo da Palavra. São traços que precisam
atravessar todas as dimensões do serviço presbiteral: a
celebração dos sacramentos, a coordenação
da comunidade, o compromisso sócio-transformador.
· De maneira
simples e direta, o presbítero será um “homem de
oração”. Sem isso, não passará de um
mero propagandista de doutrinas ou de um negociante de coisas
sagradas. O encontro pessoal com Cristo e a prática do
ministério pastoral com “os
olhos fixos n’Ele”
(Lc 4,20) constituem a identidade profunda do presbítero. Ora,
só à força de olhá-lo, é que se
acaba amando a Jesus Cristo; mas só olhamos bem de joelhos.
“Rezar é
freqüentar Jesus” (Charles de Foucauld). “Só ao
rezar, está o homem inteiro imediatamente presente diante de
Deus. A fé do presbítero de hoje
é a fé de
um presbítero que reza, de presbítero misticamente
contemplativo, ou não é fé nenhuma.
O presbítero há
de ser orante, se quiser ser crente e profeta da Boa Nova. Temos que
ser presbíteros que rezam. Que suportam rezando as trevas da
vida.
Mesmo se sua prece for
participação na agonia do Horto ou no grito do
Abandonado pelo Pai na cruz” (Karl Rahner).
· A mística
do presbítero será sempre uma mística
profundamente eucarística. Uma mística que tenha sua
“fonte” e seu “cume” na Eucaristia celebrada com o povo e
adorada em silêncio. Como ensina Tomás de Aquino, ela
contém “todo o bem espiritual da Igreja”.
É efetivamente
na Eucaristia que encontramos tudo:
Cristo com o Pai e o
Espírito, a comunidade com os seus pastores, a oração
da comunidade e toda a sua vida, trazida como matéria da
oferenda, da intercessão e da ação de graças.
A Eucaristia como sacramento da comunhão, realiza a síntese
da Igreja e do Mundo, da ação e da contemplação,
do ministério ordenado e dos leigos, de Deus e do gênero
humano.
· Um traço
cada vez mais imprescindível para a vida e o ministério
do padre será o de uma efetiva comunhão-participação
com seus irmãos presbíteros e com seu bispo. Os
desafios e chances, as alegrias e tristezas, os fracassos e os êxitos
de um padre pertencem ao presbitério do qual faz parte e no
qual recebe seu mandato da Igreja. O trabalho pastoral em equipe, a
revisão de vida, o senso eclesial, o apoio mútuo, o
cultivo da amizade, as fraternidades de presbíteros são
traços a serem permanentemente
trabalhados no futuro.
Não se concebe mais um presbítero sem presbitério,
assim como não se pode conceber um presbitério sem o
povo de Deus.
· Numa Igreja
missionária, ministerial e profética caberá ao
presbítero ser o traço de união da comunidade e
dos movimentos reunindo-os, para além de suas diferenças,
em função de um só e mesmo compromisso com a
pastoral de conjunto.
Até recentemente
o padre concentrava em si “a síntese dos ministérios”.
Compete-lhe agora “o ministério da síntese”. O
presbítero de amanhã, mantendo sua função
essencial de coordenação, deverá apoiar e
suscitar os carismas, serviços e ministérios
necessários à construção da comunidade em
seu testemunho ao mundo. Para conseguir essas metas, o presbítero
deve seriamente rever as prioridades de seu ministério,
evitando a sobrecarga com tarefas burocráticas ou secundárias,
descentralizando as atividades e confiando aos leigos e leigas os
serviços, os ministérios que lhes convém,
respeitando a iniciativa e a justa autonomia de todos os que se
entregam ao serviço do Evangelho.
· A vizinhança
do pobre e sua realidade é uma condição para
manter o espírito evangélico numa sociedade narcisista,
alienada e excludente como a nossa. “Assumimos nosso compromisso
evangélico de honrar os pobres do Brasil inteiro, confirmando
nossa opção
por eles: são a menina dos nossos olhos, o afeto de nossos
corações! Voltamos a anunciar-lhes, com Jesus: “Felizes
vocês que têm fome, porque serão saciados! Felizes
vocês que agora choram, porque haverão de rir” (Lc
6,21-22 - Carta de Compromisso do 10º ENP 2004). “Os pobres
nos evangelizam” (Puebla, 1147), quando assumimos sua ótica,
fazendo nossas suas esperanças e comprometendo-nos com suas
lutas e movimentos de libertação.
· O simples fato
de colocar-se ao lado dos pobres, já provoca reações
da parte dos opressores. Anunciar valores evangélicos que
estão na contramão do capitalismo neoliberal,
concentrador de bens e excludente da maioria do povo, inevitavelmente
provocará conflitos e perseguições. “Se o
mundo vos odeia, sabei que, primeiro, me odiou a mim. Se fôsseis
do mundo, o mundo amaria o que era seu...