quinta-feira, 28 de setembro de 2017

FM-03- A MENSAGEM DE BÉNI-ABBÉS


CAPÍTULO 2 – MENSAGEM DE BENI-ABBÉS (23/02/1950)

“Faz já cinco dias que estamos em Beni-Abbés. Ocupado com os irmãos, as irmãs e a capela do Pe. De Foucauld, em que o Santíssimo Sacramento está exposto dia e noite desde domingo, o tempo correu para mim velozmente. Vivemos na oração e no recolhimento que emanam desa primeira Fraternidade.”


“Tudo aqui é muito simples e muito evocador do Sacrifício Eucarístico, que é adorado o dia todo pelos Irmãozinhos e Irmãzinhas”. Às refeições (meio-dia e à tarde), lemos os “Escritos Espirituais” do Pe. De Foucauld, ou passagens de sua vida, de René Bazin. Aqui suas palavras tomam “um sentido completamente novo, e procuramos saber melhor o que o Pe. De Foucauld espera de nós”. Nada podemos sem o Espírito Santo, que só o coração de um Santo pode obter de Deus.

Sua humildade é “cheia de confiança, coragem, abandono a tudo quanto quiser nosso Bem-Amado Irmão e Sr. Jesus: A fraqueza dos meios humanos é uma causa de força. Jesus é o Mestre do impossível. Uma das coisas que devemos absolutamente a N. Senhor é não termos nunca medo de nada”.


A CAPELA
Essa capela ele usava só para retiros. 

Foi aqui (em Béni-Abbés) que o Pe. De Foucauld passou horas e noites com Jesus e compreendeu o que seria sua vocação de completa disponibilidade; foi aqui que se efetuou a transformação progressiva de um ideal de vida religiosa, até então definida de modo muito estreito por um regulamento, dependente demais de um determinado quadro.

A vocação de imitar Jesus de modo mais fiel às exigências do amor ao próximo e de contao com os irmãos, se processou nesta capela. “ Irmãozinho Carlos deixa-se levar sem se apegar a nenhuma idéia preconcebida, a nenhuma fórmula de vida. Uma só coisa é importante para ele: imitar Jesus, imitar Jesus de Nazaré, entregar-se inteiramente ao amor de Jesus, da Eucaristia, dos pobres, de todas as pessoas. Sua alma é cada vez mais livre, e sua atividade exterior totalmente disponível”.

Ao mesmo tempo em que ele está pronto para tudo, até ir ao fim do mundo e a viver até o julgamento final para seguir Jesus, ele continua sempre a ser o Irmãozinho profundamente pobre de Jesus de Nazaré.


OS APELOS DE JESUS


Mas também não devemos ter medo do apelos de Jesus, de quebrar fórmulas de vida por demais estreitas ou as definições por demais rígidas.

Seguir Jesus em sua pobreza concreta. Realizar as bem-aventuranças. Amá-lo, olhá-lo, contemplá-lo numa oração que se faz contínua. Amar todos os seres humanos, especialmente os mais pobres, com amizade, por eles mesmos (gratuitamente), como se só aquela pessoa vivesse no mundo, sem procurar resultados, nem rendimento apostólico, sem medir em conta-gotas nossas atividades, sem questionar se isto ou aquilo está ou não conforme a vocação de irmãozinho.

A única pergunta que devemos fazer é esta: “Que faria Jesus em meu lugar?” Seremos julgados sobre o amor, sobre a fidelidade à correspondência às exigências de Jesus, que está vivo, seu Evangelho está vivo, Ele é nossa regra suprema de vida.

Não devemos definir nosso ideal de maneira abstrata, em referência a fórmulas incompletas. A vida de um irmãozinho = presença> vida escondida> não buscar a eficiência > misturada com os outros.

Nunca perguntar se isto ou aquilo é ou não contemplativo, se é fazer ministério, se não é atitude de um “ativo”. Devemos, como o Pe. De Foucauld, julgar nossos atos em referência à pessoa de Jesus, e à luz do amor.

As pessoas buscam Jesus em nós como uma pessoa divina, que é o Amor Encarnado. Não buscam em nós um “ideal de vida”.

Silêncio, vida escondida, vida no meio da massa, simples presença, testemunho, não – eficiência: característica de nossa vida exterior, mas não são noções que possam definir nossa Fraternidade.

Devemos, isto sim, afirmar: “Não devo fazer tal coisa pois seria contrário ao que o amor de Jesus exige de mim, não é assim que Jesus agiria se estivesse em meu lugar”.Nem o Irmão Carlos foi fiel à sua regra de 1899, pois deixou o seu eremitério de Beni-Abbés e sua clausura.

As Fraternidades devem viver o Evangelho e testemunhar Jesus até o fim do mundo, principalmente onde houver pessoas que sofrem e penam, em que Jesus não é suficientemente conhecido. Jesus irradia seu mistério de Nazaré em todos os meios, sejam quais forem. Os Irmãozinhos devem levar por toda a parte sua mensagem de pobreza, de oração, de amor, sob as mais diversas e imprevisíveis formas, desde que sejam aptas para exprimir os valores evangélicos.

Isto não significa que possam entregar-se a qualquer gênero de atividade! O critério de decisão é o amor, a união perfeita a Jesus.

Não definam nada, mas vivam! Olhem para Jesus como o Irmão Carlos olhava aqui em Beni-Abbés! Não raciocinem a partir da definição de um ideal. Jesus os levará mais longe do que vocês pensam!


A NOSSA POBREZA



Jesus quer de nós que sejamos “pobrezinhos”, verdadeiros pobres. Não se trata somente de um espírito de pobreza ou da virtude da pobreza compatível com qualquer obra: trata-se de ser pobre entre os pobres, operário entre operários, pequenino entre os pequeninos deste mundo e essa é uma opção que tem terríveis exigências!

É um apelo de Jesus para o Pe. De Foucauld e para nós: é uma participação de vida mais real com o mundo dos pobres. É uma passagem do Senhor entre nós.

As pessoas desejam encontrar uma Igreja pobre, religiosos pobres, o Cristo com sua face pobre presente no meio deles. Qualquer atividade que nos obrigasse a sair desse estado de pobreza, não seria conforme à vontade de Jesus sobre nós: seria um zelo e uma caridade mal compreendidos. Essa pobreza deve ser pura; uma pobreza de Nazaré. Pobreza que é vida. Imagem da pobreza de Deus, e não de uma concepção estreita de um só tipo de pobreza.

A pobreza de Jesus não dá para ser expressa por uma só pessoa: cada Irmãozinho exprime um aspecto da pobreza de Jesus. Exemplo: a pobreza do operário, a dos que se entregam à Providência (que não moram em um lugar fixo), a dos que estão doentes e precisam receber tudo etc.

Vivendo a pobreza dessas maneiras diferentes, ela não será deformada. O que trabalha não pode se esquecer da Providência divina, e o que não trabalha não pode se esquecer do valor do trabalho como lei do Senhor.



AMOR PELAS PESSOAS



Jesus quer que tenhamos um coração repleto de amor por todos, mas sem ficarmos obsecados em termos consciência de que um grande número de pessoas não conhecem Jesus nem o Reino de Deus.

É Jesus que deseja que a nossa lâmpada seja posta no candelabro, para que seja vista. Ele ´[e que a acendeu para esclarecer, iluminar e aquecer o coração das pessoas. Mas nós devemos deixar Jesus agir. É Ele que vai colocá-la no candelabro e não nós. Nenhum vento conseguirá apagá-la.

Não podemos impedir, sob o pretexto de vivermos uma vida escondida ou afastada voluntariamente, que as pessoas busquem se aquecer em nossas lâmpadas, no amor de Jesus que existe em nós. Não depende de nós.

Jesus quer que sejamos a luz do mundo, o sal da terra, o fermento na massa. Trata-se de SERMOS e não de AGIRMOS. Nosso trabalho é estarmos tão unidos a Jesus, que nos tornemos luz, sal, fermento com ele. O resto não depende de nós. Jesus nos quer presentes no meio do mundo, mesmo que sejamos devorados pelos que têm fome e sede da justiça divina.

O Reino de Deus se estenderá através de nós e por nós. É Jesus que deve ser o artífice disso; nós apenas vamos viver o Evangelho, ser uma luz, uma fonte de vida e de calor, como Jesus o foi. Descartemos os métodos definidos e as atividades definidas.

Se formos desconhecidos, desprezados, incompreendidos, que não o sejamos por não termos sabido transmitir a mensagem de Jesus com bastante pureza!

Não depende de nós sermos ou não desconhecidos, nem podemos dizer que nossa vocação não é a de iluminar e aquecer o mundo.

O amor vivido deve irradiar-se e nós precisamos desejar que Jesus seja mais conhecido e amado.

As Fraternidades devem, segundo Pe. De Foucauld, ser focos de onde se irradia bem longe ao redor, o amor de Jesus! Se Jesus, pois, não ficou conhecido, não foi aceito, devemos chorar, e não ficarmos alegres em termos sido desprezados!

Aceitemos que as pessoas venham avidamente iluminar-se à nossa luz e beber em nossa fonte de água viva! Isso não deve ser evitado a pretexto de se “estar fazendo apostolado” (segundo as regras dos Irmãozinhos, que desaconselham para eles certas atividades dentro da Igreja).

Mas... cuidemos de não estarmos empregando meios humanos para atrair essas pessoas!

Que o fracasso, caso haja, não tenha sido causado por nossa falta de jeito, por estreiteza de espírito ou por falta de generosidade no amor! Que não sejamos desconhecidos por não terem encontrado em nós a verdadeira fisionomia de Cristo, tal como esperam as pessoas encontrá-la.


(Padre René Voillaume trabalhando em Tubet em l947, com a irmã Magdeleine. Depois de ter estudado a língua árabe e Islâmica em Tunis, em 1933, se estabeleceu com outros sacerdotes jovens franceses no sul da Argélia, em El Abiodh, onde formou a primeira fundação dos pequenos irmãos de Jesus)

DOARMO-NOS


O dom de nós mesmos: isso é o que Jesus exige de nós, aos mais pobres, amizade gratuita, amar terna e fraternalmente.

A perfeição técnica racionaliza a satisfação das necessidades humanas, que foram etiquetadas e repartidas em serviços diversos. Cada vez mais se chama o outro pelo nome: será tratado cada vez menos como pessoa. Serão conhecidas suas enfermidades, sua falta de dinheiro, sua necessidade de uma casa, de repouso e distrações. Para cuidar disso, criam-se pesadas máquinas administrativas que desconhecerão o coração do homem.

É inegável a necessidade da técnica, mas ela escraviza o homem e nos parece que cristãos, religiosos e padres, são constrangidos a se submeterem a suas leis, para pô-la a serviço do amor, e, por isso, correm eles mesmos o risco de se deixarem escravizar por ela.

Exemplo: a religiosa que, no hospital, só pode cuidar de seus doentes como “casos”, de modo científico, não podendo amá-los como pessoas humanas, a cada um deles.

Jesus não pede aos Irmãozinhos a organizara a assistência corporal ou espiritual, a fim de obterem um máximo de eficiência. Ele apenas lhes pede de amar algumas pessoas infelizes, alguns pobres, alguns doentes, aqueles que Jesus desejar, de amá-los com amizade, ternamente, como pessoas e não como casos a socorrer.

É claro que vocês devem fazer o que lhes for possível, de acordo com os meios pobres de que vocês dispõem. “Jesus curou alguns doentes em seu caminho, amou um pequeno número de amigos e o fez num ritmo tranquilo e humano, sem procurar quantidade nem rendimento.”

Cada ser humano é, à imagem de Deus, um absoluto. Não é perda de tempo amar o mais pequenino ser humano como um irmão, como se estivesse sozinho no mundo. Qualquer que seja sua miséria (desempregado, ex-prisioneiro, família em dificuldade), ele é tão digno de amor quanto o próprio Deus.

Cuidem de não se encarregarem de uma obra organizada, qualquer que seja ela, embora vocês trabalhem em hospitais, ambulatórios, leprosários...

Entendo a obstinação dos que preferem morrer em casa, com a afeição dos seus, ou talvez até numa pobre tenda, que ser internado num “frio” hospital, mesmo que haja a esperança de cura.

Os Irmãozinhos são chamados a viver simplesmente como amigos, no meio daqueles que a sociedade não sabe mais tratar como pessoa, e entre eles, os prisioneiros, as “pessoas deslocadas”, e os condenados.



UNIDOS A JESUS


“Se não estiverem unidos a Jesus, vocês não poderão ser pobres como Ele deseja, não poderão er a coragem de tomar sobre si mesmos os sofrimentos dos trabalhadores e dos doentes, não saberão amar com um coração suficientemente humilde e fraternal. “

Perpétua contemplação do “Bem-amado Irmão e Senhor Jesus”, a força do Pe. De Foucauld.

Cuidado! O que os atrai é Jesus, que deve ser amado acima de tudo, por Ele mesmo, gratuitamente, e não como meio de realizar a vida em conformidade com o Evangelho.

Os outros são como que um transbordamento do amor que temos a Jesus.

É unicamente por Jesus que vocês começaram a deixar tudo. Essa opção deve ser constantemente renovada. Esse amor imperfeito, ainda em germe, deverá crescer. “Meus filhos, o que eu quero de vocês na oração é o amor, o amor, o amor! (Escritos Espirituais pág. 161).

É esse testemunho que o mundo atual espera, porque talvez ele tenha complicado demais as relações do homem com Deus. Raciocina-se demasiadamente! Deseja-se métodos demais! Usam-se técnicas, mesmo na vida espiritual e no Apostolado.

“Que a intimidade de vocês com Jesus, simples e ardente, seja a luz e a força de cada um. Não se envergonhem jamais de sua amizade com Jesus. Ele não pode ser alguém distante e abstrato. Toda nossa vida depende da intimidade com Ele. Ele deve nos seguir de guia. Devemos abrir a Jesus o caminho. “Rezar é pensar em Deus amando-o”, diz o Ir. Carlos”.

Na maneira de orar do Pe. De Foucauld, há um engajamento cheio de fervor, corajoso, preciso, onde ele coloca toda sua vontade, toda sua pessoa.

Estar unido a Jesus em todas as situações, por mais difíceis que pareçam.

Método simples mas preciso no serviço da oração e na presença diante de Jesus, para colocar corajosamente o melhor de nós mesmos, da nossa inteligência, de nosso coração, a fim de que Jesus possa agir:

1- Olhar silenciosamente posto em Jesus, presença amorosa a seus pés;

2- Meditar as próprias palavras de Jesus no Evangelho, para conformar a elas sua vida.

3- Tornar o Evangelho uma regra viva de vida;

4- Quanto mais no conformarmos a Ele, tanto mais o compreenderemos.

5- Transformar as luzes, por mais fracas que sejam, em atos em nossa vida. Não deixá-las apenas na inteligência, nem apenas meditá-las em círculo fechado, se forem verdades ou valores morais.

“Eu não posso conceber o amor sem uma necessidade imperiosa de conformidade e de semelhança” (E. E. Pág. 106)


A MENSAGEM DE AMOR


A mensagem de amor da qual C. De Foucauld foi o portador para o mundo moderno é vida, imitação de Jesus, simplicidade conforme o Evangelho.

Somos ou não contemplativos?

Os Irmãozinhos receberam o chamado de Jesus no sentido de imitarem por amor sua vida e Nazaré, de viverem o Evangelho entre os pobres, trazendo no coração um amor fraternal por toda criatura e e numa constante oração Eucarística; e, exteriormente, suas vidas poderão se revestir das formas mais diversas, com a condição de permanecerem fiéis à sua vocação interior, tal como acaba de ser definida, e à sua condição de “pequeninos”.


ETAPAS DE NOSSA VOCAÇÃO


O Pe. De Foucauld passou por etapas sucessivas até a plena possessão de sua vocação. Partir de uma semente e crescer, pouco a pouco, até a maturidade.

Não será, pois, desde o primeiro dia, que um Irmãozinho será capaz de dar testemunho de Jesus e de seu evangelho, numa vida de oração vivida no meio das pessoas, por maiores que sejam seus desejos e sua generosidade.

É preciso que ele cresça, atravesse fases sucessivas, duração e ordem de sucessão diferentes para cada pessoa.

Solidão> vida oculta> fadiga do trabalho> o dom de si mesmo às exigências dos pobres, > o recolhimento> o estudo: são etapas necessárias a todos; alguns terão necessidade de um tempo bastante longo de vida oculta antes de serem capazes de viver unidos a Jesus no meio das pessoas.

Outros, só poderão levar uma vida retirada, generosa, e sem ilusões, depois de se terem dado aos outros.

Colocar-se cada um na situação mais apta para facilitar o trabalho do Espírito Santo em si.

Alguns terão necessidade de longos anos de preparação antes de conseguirem viver o ideal de Irmãozinhos em plenitude.

A vida exterior não precisa ser muito diferente de um para outro, mesmo com esses diferentes aspectos da formação. A diferença está na atitude de alma a guardar, mesmo que eles estejam no trabalho externo ou em missão.

São etapas psicológicas, de um conhecimento leal de si mesmos, da compreensão que o Espírito Santo pede a cada momento.

Lembro a formação progressiva e o fato de que essas etapas não serão iguais para todos.

Maturação interior lenta, mas feita em Fraterniddes normais de trabalho ou de missão.

Necessidade de intercalar períodos de retirada, em intervalos mais ou menos longos.

É por isso que as Fraternidades se agruparam pouco a pouco em torno de Fraternidades de adoração.

Uma da principais é a de Beni-Abbés, por dois motivos:

1- número de irmãos que comporta

2- o lugar mesmo onde o Pe. De Foucauld viveu, na oração, o ideal evangélico que eles vivem agora.