segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O SILÊNCIO: 6ª PARTE

6- O SILÊNCIO – THOMAS MERTON

(THOMAS MERTON.)
I – A chuva pára e um pássaro canta.
II- Deus, nosso Criador e Senhor, deu-nos uma linguagem para falar e ouvir. A linguagem é a chave que revela a odos o céu, mas quando a palavra nos avisa que o noivo vem, em seguida nos convida a nos comunicar com Ele, na solidão, sem pensamentos discursivos, no silêncio de todo o nosso ser. Quem não estiver disposto a abandonar suas ideias e suas palavras, não pode seguir adiante.
III- Não deseje ser acariciado e consolado por Deus: deseje, sobretudo, amá-lo. Da mesma forma, não deseje ansiosamente que os demais sintam consolação em Deus, mas sim, que os ajude a amar a Deus.
Não busque consolação ao falar de Deus, mas que Ele seja glorificado. Se você ama a Deus de verdade, nada pode consolar você mais do que a glória dele. Agindo assim, você será humilde o bastante para receber consolações de sua mão, pois desse modo, Ele estará se glorificando em nossa alma.
Muitas vezes o nosso silêncio e nossas orações levam mais as pessoas a conhecerem a Deus que todas as palavras que possamos dizer sobre Ele. O silêncio lhe dá glória.
IV – Se você vai à solidão com uma língua silenciosa, o silêncio dos seres mudos dividirá com você seu sossego. Entretanto, se você for à solidão com um coração silencioso, o silêncio da criação falará mais forte que as línguas dos homens e as dos anjos.
V- O silêncio da língua e da fantasia nos põe em contato com a paz das coisas que existem só por Deus e não por si mesmas, mas o silêncio de todos os desejos desordenados nos põe em contato com Deus. Aí, conseguiremos viver nele somente, Ele que nos fala com um silêncio muito mais profundo.
VI – Os que amam o barulho e a futilidade vivem cobrindo, com o seu barulho, o silêncio das selvas, das montanhas e do mar, por medo que um mundo tranquilo possa acusá-los de sua futilidade. Agem nervosamente, com o pretexto de agirem com alguma finalidade. Assim também acontece com o avião: ao passar, parece que nega a realidade das nuvens e do céu, com sua prepotência. Depois que ele passa, volta o silêncio e a tranquilidade. É o silêncio do mundo que é real. Nossos ruídos, nossos negócios nossas finalidades e todas as vãs afirmações relativas a eles, tudo isso é ilusório. Apesar de todos os ruídos externos, a árvore produz os seus frutos em silêncio.
VII – É muito difícil que um homem que só vê a natureza quando esta vai lhe proporcionar um lucro financeiro (como derrubar uma árvore para vender a madeira, ou matar um boi para um churrasco), é muito difícil que conheça o silêncio do amor e, portanto, o silêncio de Deus, que é a caridade, e que não destrói tudo o que ama, que dá vida a todos aos que atrai a esse seu silêncio.
VIII – O silêncio não existe em nossa vida só por si, mas está destinado a alguma outra coisa. O silêncio gera a palavra. Falamos para confessar a Cristo e permanecemos em silêncio para meditar sobre ele e entrar mais profundamente em seu silêncio, que é ao mesmo tempo o silêncio da morte e da vida eterna – o silêncio da noite de Sexta Feira Santa e a paz da manhã da Ressurreição.
IX – Recebemos no coração o silêncio de Cristo quando proferimos pela primeira vez de coração a palavra da fé. Trabalhamos nossa salvação no silêncio e na esperança. O silêncio é a força de nossa vida interior. O silêncio entra misteriosamente na composição de todas as virtudes e, inclusive, preserva nossa vida inteira da corrupção.
O silêncio da virtude é a caridade, que deve dar a cada virtude uma vida sobrenatural, e que é silenciosa, porque está arraigada em Deus. Sem esse silêncio, nossas virtudes são só sons, barulho exterior, manifestação que resulta em nada o que as virtudes manifestam é sua caridade interior, que tem um silêncio seu especial. E neste silêncio se esconde uma pessoa: Cristo, o mesmo escondido, assim como é proferido, no silêncio do Pai.
X – Se preenchermos a vida com o silêncio, viveremos de esperança e Cristo vive em nós e dá consistência à nossas virtudes. O silêncio é a base sólida onde está arraigada nossa confissão pública de fé, convertendo, também aos que ouvem ao silêncio de Cristo, onde descobrem a si próprios, o seu verdadeiro ser.
As palavras inúteis que falamos nos impedem de ouvir coisa alguma na profundidade de nosso coração, onde Cristo vive e fala em silêncio. E, o pior, falamos tudo o que não deveríamos falar e, quando precisamos declarar quem e o que somos, estaremos sem palavras, mostrando que não seremos nada, nunca.
XI – Tem que haver um momento do dia em que esquecemos tudo o que somos, o que sabemos, e nos coloquemos a rezar como se fosse a primeira vez da vida.
XII – No silêncio aprendemos a distinguir as coisas. Quem ama a Deus, também ama o silêncio, porque teme perder seu sentido de discernimento. Evita o ruído, que faz com que não se distinga a realidade da fantasia, confundindo pelo movimento todas as coisas num amontoado indefinível e indistinguível.
XIII – O silêncio que não ouve, não acende, mas apaga a chama de amor que brota da oração.
XIV – A vida não é um ininterrupto fluir de palavras que a morte interromperá. Ela é entremeada de silêncio. Muitos resistem ao fecundo silêncio do seu ser com ruídos contínuos dos pensamentos sem sentido, dos carros, do trânsito, das rádios... Confundem sua vida como ruído, para fugir da morte. Não sabem que os seus corações têm raízes num silêncio que não é morte, mas vida!
XVI – Se a morte for par nós como uma estrangeira indesejada, quer dizer que Cristo também é isso para nós, pois com a morte Cristo também vem, para trazer-nos a vida eterna que adquiriu para nós com sua própria morte. Por isso os que amam a vida eterna pensam sempre na própria morte. Sua vida está preenchida por um silêncio que é uma antecipada vitória sobre a morte. É no silêncio que a morte se torna nossa serva e até mesmo nossa amiga. Os pensamentos e orações que surjam do silencioso pensamento da morte são como árvores que crescem próximo à água. São pensamentos fortes que vencem o medo da desgraça porque derrotaram a paixão e o desejo.


XVII – Os santos são os que quiseram ser os mais pobres na vida e que, mais do que quaisquer outros, exultaram na suprema pobreza da morte.