9- O MEDO E A FASCINAÇÃO DO SILÊNCIO
Carlo Maria Martini)
Se no princípio era a Palavra, e pela Palavra de Deus, chegada até
nós, começou a realizar-se nossa redenção, de nossa parte deve haver o
silêncio, para ouvir essa Palavra.
O silêncio que escuta, acolhe, que se deixa avivar. É claro que, em seguida, usaremos nossa palavra para agradecer, adorar, suplicar; mas em primeiro lugar, o silêncio.
O silêncio que escuta, acolhe, que se deixa avivar. É claro que, em seguida, usaremos nossa palavra para agradecer, adorar, suplicar; mas em primeiro lugar, o silêncio.
Podemos dizer que a capacidade de viver um pouco de silêncio interior
conota o verdadeiro crente e o separa do mundo da incredulidade. Quem não
aceita ou não acredita em Deus, afasta de seu pensamento o Deus vivo, que cobre
todo espaço, não suporta o silêncio. Para ele, o silêncio é a marca aterradora
do vazio. Qualquer ruído, por mais que seja tormentoso e obsessivo, lhe parece
agradável. Quando as vozes se calam, ele se vê frente a frente com o horror do
nada. O ruído, conversa mole, qualquer barulho é bem recebido por eles, para
distrair da mente do conhecimento arrepiante do universo deserto.
O homem “novo” (de olhos da fé penetrantes, que vê além do aparente e
tem um coração capaz de amar o Invisível), sabe que o vazio não existe, que o
nada é vencido pela divina Infinitude, que o universo está povoado de criaturas
alegres, que o expectador já goza, de certo modo, da exultação cósmica,
refletida pelo mistério de luz, de felicidade que substancia a vida inesgotável
do Deus Trino.
Por isso o homem novo, como o Senhor Jesus, que ao alvorecer subia
solitário para os montes (Mc 1,3; Lc 4,42; 6,12; 9,28) aspira ter para si um
espaço imune a qualquer ruído alienante, onde seja possível aplicar o ouvido e
perceber algo da festa eterna e da voz do Pai.
O homem velho (que tem medo do silêncio) e o homem novo convivem
normalmente, em diferentes proporções, em cada um de nós. Somos agredidos
exteriormente por avalanches de palavras, sons, clamores, que ensurdecem nosso
dia e nossa noite. Todos estamos interiormente atingidos pela oratória
excessivamente mundana, que com mil futilidades nos distraem e faz com que nos
percamos.
O homem novo que há em nós tem, pois, de lutar para assegurar no céu
sua alma, esse prodígio de “um silêncio durante meia hora” de que fala o
Apocalipse 8,1. Que seja um silêncio verdadeiro, cumulado da Presença
ressonante da Palavra, pronto para escutar, aberto à comunicação.