A escravidão dos homens, a pátria terrestre passam depressa, como a vida. (...)
Mas, dito isso, e aliviando-os [os escravos] tanto quanto possível, parece-me que o dever não está completo e que é necessário dizer, ou fazer dizer por quem de direito: “Non licet!” [Não é permitido!], “Vae vobis hypocritis!” [Ai de vós, hipócritas!”, já que inscreveis nos selos e por toda a parte “Liberdade, Igualdade, Fraternidade, Direitos do Homem” e que aferrolhais as algemas dos escravos.
Mas, dito isso, e aliviando-os [os escravos] tanto quanto possível, parece-me que o dever não está completo e que é necessário dizer, ou fazer dizer por quem de direito: “Non licet!” [Não é permitido!], “Vae vobis hypocritis!” [Ai de vós, hipócritas!”, já que inscreveis nos selos e por toda a parte “Liberdade, Igualdade, Fraternidade, Direitos do Homem” e que aferrolhais as algemas dos escravos.
Condenais às galeras os que falsificam vossos cheques e permitis que roubem as crianças e seus pais e que as vendam publicamente; que punis o roubo de uma galinha e permitis o roubo de um homem (realmente quase todos os escravos dessas regiões são crianças nascidas livres e violentamente arrebatadas, de surpresa, a seus pais)...
Além do mais, é necessário “amar o próximo como a si mesmo”, fazer por essas pobres almas “o que gostaríamos que fizessem por nós”, impedir que se perca algum desses que Deus nos confiou – e Ele nos confia todas as almas do nosso território...
Não é necessário imiscuir-nos no governo temporal. Ninguém está mais convencido disso do que eu. Mas é preciso “amar a justiça e odiar a iniquidade”, e quando o governo temporal comete uma grave injustiça contra os que, de certa maneira, estão sob nossa guarda (sou o único padre da Prefeitura num raio de 30 km) é preciso dizer-lhe, pois somos nós que representamos, na terra a justiça e a verdade e não temos o direito de ser “sentinelas adormecidas”, “cães mudos”, “pastores indiferentes”. (Carta a Dom Martin em 07/02/1902, Cahiers Charles de Foucauld, v.2)
Numa palavra, pergunto-me (estamos de pleno acordo quanto à conduta a manter com os escravos) se não temos de elevar a voz, direta ou indiretamente, para dar a conhecer na França essa injustiça e esse roubo sancionado que é a escravatura em nossas regiões, e dizer ou fazer com que seja dito: eis o que se passa, “Non licet” [Não é permitido]...
Preveni o Adminstrador Apostólico e talvez seja o suficiente. Longe de mim desejar falar e escrever, mas não quero trair meus filhos, nem deixar de fazer por Jesus, vivo em seus membros, aquilo que Ele necessita: é Jesus que está nessa dolorosa condição, “o que fizerdes a um desses pequeninos é a mim que fazeis ...”. Não quero ser um mau pastor ou um cão mudo... Tenho medo de sacarificar Jesus ao meu comodismo e à minha grande inclinação pela tranqüilidade, à minha covardia e timidez naturais (Id., ib.).
O fim e a abolição da escravatura se impõem porque se trata de justiça e de direito (Carta a Dom Martin, 17/3/1902).